Durante o painel Extrativismo Sustentável e os Impactos para a Economia da Amazônia, realizado no Seminário Internacional Txai Amazônia, especialistas e lideranças discutiram como o extrativismo, praticado em unidades de conservação e territórios indígenas, representa não apenas um modo de vida, mas também um modelo viável de desenvolvimento econômico para a região. O debate, realizado na manhã desta quinta-feira, 26, foi mediado por Eufran Amaral, pesquisador da Embrapa e ex-secretário de Meio Ambiente do Acre, e contou com a participação da analista ambiental do ICMBio, Rosenil Oliveira, do coordenador da OPIRJ, Francisco Piãko, e da professora Andréia Alexandre, da Universidade Federal do Acre.
O painel foi marcado pela crítica à ideia de desenvolvimento que não considera os valores, tempos e conhecimentos dos povos da floresta. Para Francisco Piãko, liderança do povo Ashaninka, a sustentabilidade é algo vivido na prática. “A floresta é o que garante nossa vida. A gente planta, pesca, caça, faz roupa, vive em harmonia. Se transformar tudo em produto para o mercado, nós estamos ameaçados”, afirmou. Ele destacou ainda os riscos dos contratos comerciais e da extração predatória, que podem destruir estruturas sociais locais. “Não dá para vender tudo e depois ficar sem comida. Isso é atraso”, alertou.
Rosenil Oliveira trouxe a perspectiva da gestão das unidades de conservação federais, mostrando os avanços e entraves do ICMBio. Um dos gargalos apontados foi a dificuldade em identificar e qualificar os verdadeiros beneficiários das políticas públicas. “Sem saber quem está na floresta, não há como garantir que os programas cheguem a quem realmente precisa”, explicou. Ela também questionou: “Será que sabemos comunicar o valor da sociobiodiversidade? A sociedade brasileira sabe de onde vem o açaí que consome?”.
A professora Andréia Alexandre reforçou a importância de políticas públicas com continuidade e planejamento. Em sua fala, trouxe o exemplo da parceria com os Ashaninka para a comercialização legal de sementes florestais. “Eles tinham a matéria-prima e o conhecimento. Faltava o laudo técnico, a estrutura legal. Fomos atrás disso juntos, em uma construção de confiança”, relatou. Ela também mencionou os desafios enfrentados na Reserva Extrativista Chico Mendes, onde atua há mais de 30 anos: “A falta de acesso, os entraves burocráticos, a descontinuidade das políticas e a pressão por respostas imediatas são barreiras para quem quer manter a floresta em pé”.
Entre os temas centrais do debate, destacou-se a necessidade de uma bioeconomia que valorize o território, os modos de vida locais e as decisões coletivas. Os painelistas foram unânimes ao afirmar que não existe bioeconomia sem floresta e sem gente. Para além da produção, é preciso garantir segurança alimentar, acesso a políticas públicas e reconhecimento da diversidade cultural. As propostas incluíram a criação de centros comunitários de geotecnologia para planejamento territorial com juventudes, incentivo ao cultivo de espécies nativas, como castanheira e seringueira, e mecanismos eficazes de pagamento por serviços ambientais.
Ao final das falas e das perguntas do público, ficou evidente que a bioeconomia que se pretende consolidar na Amazônia precisa ser construída com as populações locais, e não para elas. As experiências compartilhadas apontam que os maiores riscos estão na tentativa de impor modelos externos que não dialogam com a realidade dos territórios. Como alertou Piãko, “se o mundo quer salvar a Amazônia, tem que começar escutando quem vive nela”.
Como mensagem central do painel, podemos ver que o extrativismo sustentável é viável, necessário e urgente, mas requer respeito aos saberes tradicionais, fortalecimento institucional e compromisso com a inclusão. “Não podemos continuar sendo apenas provedores de matéria-prima. A floresta tem limites, as pessoas também”, resumiu Andréia. O desafio é transformar esse conhecimento em políticas públicas duradouras, capazes de gerar renda, preservar ecossistemas e garantir um futuro justo para a Amazônia.