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Entre o Editorial da Folha e a Nota da Fineduca: o que é investimento de qualidade na educação? – Artigo de Binho Marques

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O Brasil investe cerca de 5% do PIB em educação, um percentual que impressiona. À primeira vista, parece um esforço exemplar. Mas, quando dividimos esse volume de recursos pelo número de estudantes, o resultado é um dos menores investimentos por aluno da OCDE. A conta não fecha porque o problema não está apenas no tamanho do bolo, mas em como e onde o bolo é repartido.

O percentual do PIB é uma fotografia política: mostra o grau de prioridade, mas não revela qualidade nem eficiência. Países diferentes podem aplicar o mesmo percentual do PIB e obter resultados completamente distintos. Depende de como organizam seus sistemas e de quanto garantem equidade e continuidade nas políticas públicas.

Outro critério é comparar o Brasil com países de características semelhantes, como Chile, México ou Colômbia. Essa análise é mais justa, pois ajusta pela capacidade fiscal e pelo tamanho da população. Mas há um risco: quando todos têm problemas parecidos, a comparação pode confortar na mediocridade. A referência correta é importante, mas a direção da mudança é o que realmente importa.

Comparar o gasto por aluno do Brasil com o dos países de melhor desempenho da OCDE pode ser inspirador, desde que não seja ingênuo. Finlândia, Canadá e Coreia não chegaram lá apenas porque gastaram mais. Chegaram lá também porque planejaram melhor. Transformaram investimento em capacidade pública, em gestão e em compromisso de Estado.

O Brasil tentou enfrentar esse desafio com o Custo Aluno-Qualidade (CAQ). A ideia nasceu como tentativa de definir o investimento mínimo necessário para garantir um padrão básico de qualidade. Mas parte da formulação acabou presa a uma visão normativa e homogênea, que trata a qualidade como se fosse um preço fixo, igual em todo o território nacional.

Minha leitura é diferente. O CAQ não deve ser um número, mas um processo permanente de pactuação federativa, que considere as desigualdades territoriais e a capacidade de gestão local. Um instrumento vivo, que ajude a converter o gasto em aprendizado e equidade, e não um índice estático a ser replicado de forma burocrática.

A pergunta que deveríamos fazer não é “quanto investir?”, mas “para quê e com que Estado”. Isto é, com que capacidade pública, com que instituições, com que projeto de país.

Um investimento é razoável quando é compatível com a riqueza do país, comparável ao de seus pares e suficiente para garantir equidade e aprendizagem. Mas só faz sentido se for capaz de transformar recursos em capacidade pública.

A educação de qualidade não se compra. Nós, como governo e sociedade, a construímos. Mais do que isso: o custo da qualidade não está no orçamento; está na inteligência do planejamento, na coerência das políticas e na persistência das instituições.

Enquanto não entendermos isso, continuaremos gastando muito e investindo pouco.


Sobre o autor:
Binho Marques, 62 anos, é ex-governador do Acre (2007-2010). Historiador e mestre em educação pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro). Atuou como professor, gestor público, secretário de Educação (municipal, estadual e no MEC/SASE), consultor do Unicef e parceiro de Chico Mendes em comunidades extrativistas. Hoje integra o Conselhão e atua na tmc1 – escola de gestão.

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