A intensificação da guerra econômica entre China e Estados Unidos reacende discussões estratégicas sobre rotas logísticas alternativas para exportação na América do Sul. Nesse contexto, a possibilidade de reativação ou avanço de projetos ferroviários que cruzam o Acre, como parte de um corredor transoceânico ligando o Atlântico ao Pacífico, volta ao centro do debate político e comercial.
Com a imposição de tarifas de até 245% por parte dos Estados Unidos sobre produtos chineses, e as respectivas retaliações de Pequim, o Brasil se posiciona como alternativa logística e produtiva diante do impasse entre as duas maiores economias globais. O país já é o principal fornecedor de grãos para o mercado chinês e projeta, para a safra 2024/25, um volume recorde de 330,3 milhões de toneladas, o que agrava os gargalos nos portos e na malha de transporte interno.
A visita recente de uma comitiva chinesa a Brasília e a estados produtores, incluindo o Acre, reacendeu o interesse no chamado Corredor Bioceânico, que prevê o uso de ferrovias e rodovias para escoar a produção do Centro-Oeste até o litoral do Peru. A alternativa reduziria em até dez dias o tempo de transporte até a Ásia. Nesse cenário, a malha ferroviária que passa pelo Acre, historicamente pouco explorada, poderia ganhar nova relevância estratégica.
O plano apresentado à delegação chinesa inclui a integração da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol) com outras linhas, além da conexão a portos estratégicos, como os de Santos (SP), Ilhéus (BA) e o futuro porto de Chancay, no Peru. A proposta também é considerada no escopo do Novo PAC, como forma de acelerar o escoamento da produção agrícola, sobretudo soja e milho, e de minérios.
A movimentação diplomática reflete um cenário de pressão por diversificação logística. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem encontros marcados com autoridades chinesas ainda em maio, em agenda que inclui temas de infraestrutura e comércio.
A dependência atual do transporte rodoviário, os gargalos nos portos e a sobrecarga nas principais rotas de escoamento revelam uma fragilidade estrutural diante do aumento da demanda externa. O Acre, nesse sentido, surge como peça de um quebra-cabeça maior, tanto pela sua localização geográfica quanto pelo seu potencial de integração com os mercados do Pacífico.
Com isso, a antiga proposta de construção ou revitalização de uma ferrovia que ligue o Acre ao Peru e ao restante do Brasil pode ser retomada, agora sob um novo prisma: o de reposicionamento geopolítico do Brasil em um tabuleiro global em transformação. A guerra tarifária entre Estados Unidos e China, longe de ser apenas um embate comercial, coloca o Brasil diante da necessidade de respostas logísticas concretas. O Acre pode ser um dos territórios-chave dessa transição.