Caravanas de diferentes estados chegam a Brasília nesta terça-feira para a 2ª Marcha das Mulheres Negras por Reparação e Bem-viver, marcada para 25 de novembro, reunindo delegações que viajam por quase dois dias para participar da mobilização que espera reunir 1 milhão de mulheres no Distrito Federal. O objetivo central é defender políticas voltadas ao acesso a direitos básicos, à reparação histórica e ao enfrentamento das desigualdades que atingem a população negra no país.
A marcha de 2025 retoma debates iniciados há uma década, quando a primeira edição, em 2015, marcou um ponto de inflexão na organização de coletivos de mulheres negras. Na Paraíba, esse processo deu origem à Abayomi, organização criada após o retorno daquela mobilização para fortalecer discussões sobre racismo, violências e acesso a direitos. Segundo Durvalina Rodrigues, coordenadora da entidade, o movimento voltou a se estruturar a partir de encontros preparatórios realizados ao longo deste ano. Ela relembra que a expressão “teimosando”, usada pela líder quilombola Elza Ursulino em 2024, tornou-se referência para a mobilização: “Durante uma homenagem, Elza contou como era reprimida por provocar reflexões sobre a situação do quilombo e que ela, na ‘teimozeira’, insistia em melhorar”.
As atividades promovidas pela Abayomi em 2025 abordaram o bem-viver como prática coletiva e o autocuidado como ato político, articulando esses temas às reivindicações por reparação. A discussão destaca os impactos deixados por quase quatro séculos de escravidão e pela ausência de políticas públicas que, após a abolição, garantissem acesso à terra, educação e condições básicas de cidadania. A psicóloga Hidelvânia Macedo, integrante da organização, explica que a falta de tempo para o autocuidado, em meio a pressões no trabalho, no lar e na comunidade, contribui para o adoecimento e produz efeitos sociais amplos. Para ela, quando exercido, o autocuidado reforça autoestima e autodeterminação.
Nos debates que antecederam a marcha, o tema da reparação antecedeu o do bem-viver. Durvalina afirma que essa agenda envolve compreender os efeitos do colonialismo e de políticas que definiram quem teria ou não direito à vida. Ela cita reflexões sobre segurança e saúde como parte desse processo e relaciona o debate ao conceito de necropolítica, que analisa como grupos específicos são mais expostos à violência e ao abandono estatal. “Quando as mulheres começam a perceber que a política de morte, a necropolítica, tem um viés histórico, com base no racismo, percebemos um despertar”, afirmou.
Como resultado desse processo, a Marcha das Mulheres Negras lançou o Manifesto Econômico e Institucional, que apresenta propostas distribuídas em sete eixos, entre elas a criação de um fundo econômico, taxação de grandes fortunas e heranças, políticas de redução da taxa de juros, blindagem do orçamento social, reformas agrária e urbana, além de linhas de crédito e ações afirmativas para empresas que prestam serviços ao setor público. A expectativa é que o documento sirva de base para negociações com governos e instituições após a marcha.
Enquanto as caravanas avançam rumo à capital federal, o movimento reforça que a mobilização é parte de uma trajetória contínua de organização e reivindicação. Para Durvalina, a marcha de 2025 amplia esse processo: teimosando como a quilombola Elza, ela acredita que as mulheres negras fortalecem redes e impulsionam transformações políticas e sociais ao reivindicar reparação, bem-viver e condições equânimes de participação na vida pública.
Fonte: Agência Brasil