O líder indígena Haru Kuntanawa atua na linha de frente da luta pelos direitos do povo Kuntanawa, grupo originário da região do Alto Juruá, na fronteira entre Brasil e Peru, no Acre. “Eu sou neto de anciões que testemunharam a violência. A gente está aqui porque sobreviveu a um genocídio”, afirma Haru, ao relembrar a dizimação de dezenas de aldeias durante o primeiro ciclo da borracha, entre 1877 e 1910.
Segundo Haru, os Kuntanawa foram capturados, escravizados e exterminados. Apenas uma aldeia restou, sob domínio de seringalistas. “Por muito tempo nosso povo nem foi reconhecido como indígena”, relata. Esse cenário começou a mudar somente cerca de 80 anos após o genocídio, com a criação da Reserva Extrativista do Juruá.
Mesmo com esse avanço, o povo Kuntanawa ainda não teve seu território demarcado. “Sem terra demarcada, não temos educação nem saúde diferenciada. Nossos jovens enfrentam discriminação nas escolas, vindas até de professores”, diz Haru. Ele afirma que a luta pela demarcação já dura 25 anos e lembra que, mesmo com uma decisão do Ministério Público Federal de 2018 determinando o reconhecimento do território, o processo não foi concluído.
A reivindicação dos Kuntanawa vai além da demarcação. Através da Associação Sócio Cultural e Ambiental Kuntanawa (ASCAK) e da Organização dos Povos Indígenas do Rio Juruá (OPIRJ), lideradas por Haru, as comunidades estão organizando uma comissão de justiça para documentar os danos sofridos durante o genocídio. “Queremos envolver todo o Estado brasileiro, para que possamos medir todos os impactos da violência”, explica.
O objetivo é elaborar um relatório que sirva de base para reivindicar reparações. “A gente quer mais do que nosso território de volta. A gente quer toda a cultura que nos foi retirada”, afirma Haru. Para ele, esse processo pode marcar um novo capítulo na política indígena brasileira.
A Mostra Cultural Digital Memórias Musicais da Amazônia estreia no canal do Baquemirim no YouTube com uma série de vídeos que registra trajetórias, repertórios e práticas de mestres da música do Acre. A produção reúne depoimentos, apresentações e relatos sobre processos criativos e contextos socioculturais ligados às tradições musicais do estado.
O episódio inaugural apresenta Osmar do Cavaquinho, 87 anos, músico cuja obra circula entre cumbia, choro, samba, forró e xote. Com mais de cinco décadas de atuação, ele é autor de composições presentes no repertório popular acreano, como Beijo Ardente e Muchatita, e tem o cavaquinho como instrumento central de sua produção.
O segundo episódio registra a trajetória de Zenaide Parteira, cantora e compositora, filha de seringueiros e descendente Kampa (povo Ashaninka). Com mais de 700 composições e o álbum Mulher Vagalume (2021), Zenaide ampliou seu alcance nacional em 2025 ao gravar É No Balanço Dela com Geraldo Azevedo, colaboração que aproximou referências tradicionais e circuitos contemporâneos.
No terceiro episódio, o foco é Nilton Bararu, músico formado em ambiente familiar de instrumentistas e no curso de música do SESC nos anos 1980. Integrante do grupo Som da Madeira, Nilton mantém um repertório que inclui marchinhas, baião e valsas amazônicas.
O quarto vídeo acompanha José Pinheiro de Freitas, conhecido como Mestre Zé Bolo, do povo Nawa. Sua produção aborda histórias dos seringais, experiências de luta por terra e registros de memórias dos povos originários.
O quinto e último episódio apresenta Francisco “Saraiva” Soares, de Xapuri, cuja trajetória reúne a prática familiar do cavaquinho, a vivência nos seringais e o retorno à atividade musical em Rio Branco a partir da década de 1980.
A Mostra integra o Programa Cultura Viva do Ministério da Cultura e do Governo Federal, em ação conjunta com a Prefeitura de Rio Branco, Fundação Garibaldi Brasil, Instituto Nova Era e Baquemirim, com produção da Aruê!. O projeto também realizou o Encontro de Saberes Tradicionais — Práticas Musicais na Amazônia Acreana, em 28 de outubro de 2025, no auditório da EMAC, com mediação da antropóloga Sarah Almeida (IPHAN-AC). No evento ocorreu o lançamento do livro Escolas de Baques — Estudos de Música Amazônica, de Alexandre Anselmo.
A escritora Beatriz Barroso Cameli lança nesta segunda-feira, 24, em Brasileia, a biografia Orleir Cameli – Um homem à frente de seu tempo, obra produzida com apoio da Fundação Elias Mansour (FEM) e dedicada à trajetória do ex-governador do Acre e liderança histórica do Vale do Juruá. O lançamento ocorre no Centro Cultural Sebastião Joaquim Dantas Barroso e integra uma programação que passará por quatro municípios do estado.
A agenda inclui ainda uma noite de autógrafos em Rio Branco no dia 26, às 19h30, no Centro Cultural do Tribunal de Justiça do Estado do Acre. Segundo o documento, Beatriz Cameli apresenta a obra como resultado de uma pesquisa sobre a vida do ex-governador, articulando memória familiar, história regional e o processo de ocupação do Acre. A biografia aborda períodos como o Ciclo da Borracha, o avanço dos regatões, o papel dos sírio-libaneses na formação econômica da Amazônia e as origens da família Cameli nos altos rios do Juruá.
O livro dedica espaço também à contribuição de famílias nordestinas na formação social do estado, destacando a presença dos Messias e as alianças familiares que marcaram a história de Cruzeiro do Sul. A narrativa acompanha o percurso de Orleir e de seus irmãos desde o nascimento no seringal, passando pelo trabalho junto aos pais Marmud e Marieta, até a formação do grupo empresarial da família. Beatriz relata que o ex-governador “tinha compromisso com seu povo e sua terra”, descrevendo ainda o encontro do casal no Peru, a união e a mudança para o Acre.
A obra aborda a entrada de Orleir Cameli na política, sua eleição para a Prefeitura de Cruzeiro do Sul e, mais tarde, para o governo do Acre, mencionando os desafios enfrentados ao longo da gestão. O documento destaca que o livro reconstrói esse período sem revanchismo, ressaltando a relação do ex-governador com a população e com sua base política. Após a saída da vida pública, o texto registra sua atuação como empresário e sua dedicação a ações filantrópicas. Também descreve o impacto de sua morte, as homenagens e a memória preservada por familiares e moradores do Acre.
Além dos lançamentos em Brasileia e Rio Branco, a programação inclui eventos em Sena Madureira, no dia 28 de novembro, no auditório Professora Francisca Souza da Silva, e em Tarauacá, no dia 29, no Teatro Municipal José Potyguara.
O grupo Moças do Samba apresenta na quarta-feira, 19, às 19h30, o espetáculo Grandes Mestres na Usina de Arte João Donato, em Rio Branco, com entrada gratuita e retirada de ingressos a partir das 18h30. A apresentação ocorre na véspera do Dia da Consciência Negra e destaca por que o coletivo escolheu reverenciar nomes que estruturaram o samba e influenciaram gerações.
O espetáculo homenageia Pixinguinha, Noel Rosa, Adoniram Barbosa, Lupicínio Rodrigues, Cartola e Arlindo Cruz, reunindo interpretações que retomam composições marcadas por diferentes momentos da música brasileira. O grupo, formado por Carol Di Deus, Narjara Saab e Sandra Buh, criou a proposta após discussões internas sobre a presença feminina no samba e o papel das artistas na manutenção desse repertório. Segundo Narjara Saab, produtora cultural e uma das criadoras da montagem, a motivação surgiu do desejo de aproximar o público do legado desses compositores e evidenciar como essas obras dialogam com o presente. “Celebrar esses mestres, especialmente na véspera da Consciência Negra, é reconhecer que nossa voz hoje dialoga com suas trajetórias”, afirmou.
A apresentação reforça a importância da data ao destacar a contribuição negra para a formação cultural do país. O grupo afirma que o espetáculo convida o público a reconhecer a continuidade histórica que atravessa o samba e a relação entre memória, identidade e produção musical. “Estamos muito felizes em estrear um novo trabalho e em uma data tão emblemática”, disse Narjara Saab, ao ressaltar o sentido simbólico da estreia.
O evento marca também a abertura de uma nova fase do Moças do Samba, que busca ampliar o diálogo com o público por meio de espetáculos cênicos-musicais que combinam performance, narrativa e repertório clássico. A expectativa das integrantes é que a montagem gere novas conexões com diferentes públicos e fortaleça ações culturais voltadas ao reconhecimento do samba como patrimônio brasileiro.