Estudos recentes conduzidos por instituições científicas brasileiras indicam que a intensificação das secas na Amazônia tem prejudicado a capacidade da floresta de manter o ciclo da água e armazenar carbono. A pesquisa envolve equipes do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) e do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), com dados apresentados durante a 77ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).
As análises apontam que, nas últimas décadas, a estação seca tem se tornado mais longa e intensa. Isso, somado ao desmatamento e ao uso recorrente do fogo, tem causado estresse hídrico em grandes áreas da floresta. Segundo os pesquisadores, esse processo altera a evapotranspiração — mecanismo pelo qual a água é devolvida à atmosfera — e compromete a redistribuição da umidade dentro e fora da região amazônica.
A pesquisadora Liana Anderson, do Cemaden, destacou que mais da metade da floresta vem enfrentando eventos críticos de escassez hídrica. Isso afeta diretamente a função da floresta em recircular a água, já que entre 50% e 60% das chuvas da Amazônia são geradas localmente, a partir da umidade que a própria vegetação reemite à atmosfera.
Estudos recentes também mostram um aumento da mortalidade de árvores de grande porte durante os períodos de seca, o que impacta diretamente no sistema de redistribuição da água e pode alterar a estrutura da floresta. Essas árvores, por possuírem raízes profundas, desempenham papel essencial na extração de água do solo e sua liberação para a atmosfera.
Outra consequência observada é a perda de carbono. Um dos levantamentos apontou que áreas da floresta expostas a déficits de 100 milímetros de chuva, como na seca de 2005, perderam cerca de 100 toneladas de carbono por hectare. O pesquisador Luiz Aragão, do Inpe, ressaltou que a elevação da temperatura contribui para a mortalidade das árvores e aumenta o acúmulo de material lenhoso no solo, elevando o risco de incêndios.
A fragmentação da floresta também foi identificada como fator de agravamento da vulnerabilidade ao fogo. Paisagens contínuas, segundo os pesquisadores, só registram aumento de área queimada em anos de seca. Já em regiões fragmentadas, o risco de incêndios se mantém elevado mesmo fora desses períodos.
Apesar desse cenário, os estudos indicam a existência de áreas de resistência, denominadas refúgios hidrológicos. Dados do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) mostram que regiões com lençol freático mais superficial tendem a manter o crescimento das árvores mesmo em períodos de seca severa. No entanto, a maior parte das pesquisas ainda se concentra em áreas com lençol profundo, o que pode limitar a compreensão sobre a resiliência da floresta.
Os dados reforçam a urgência de políticas públicas voltadas à conservação da Amazônia, especialmente diante da intensificação dos eventos climáticos extremos. A continuidade dos estudos deve oferecer subsídios para estratégias de mitigação e adaptação às mudanças em curso no maior bioma do país.
Fonte: Uol