Em uma ação inédita, o Governo Federal do Brasil alocou recursos para reforçar a capacidade logística das populações indígenas envolvidas no Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). A iniciativa, liderada pelo Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS), abrange uma parceria com a Funai e gestores do PAA em 14 estados, objetivando a aquisição de veículos, embarcações e equipamentos. O investimento total é estimado em cerca de R$ 40 milhões.
No estado do Acre, a Secretaria de Estado de Agricultura (Seagri) recebeu R$ 3 milhões em recursos federais. Esta quantia, somada à contrapartida do estado, será utilizada na compra de 20 barcos de alumínio com motor, um caminhão baú refrigerado e seis caminhonetes 4×4. A finalidade desses veículos é facilitar o transporte e a distribuição de alimentos produzidos pelas comunidades indígenas, especialmente nas regiões de difícil acesso.
A Secretaria Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sesan) do MDS, em colaboração com os governos estaduais, tem como responsabilidade mapear as demandas específicas e mobilizar as populações indígenas para a participação ativa no PAA. Essa estratégia é parte de um compromisso maior do Governo Federal em promover a segurança alimentar e nutricional entre as comunidades indígenas.
A Terra Indígena Huni Kuin Kaxinawa, localizada no Acre, já está se beneficiando das ações do PAA. Em dezembro do ano passado, a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) enviou técnicos para capacitar membros da comunidade e supervisionar as primeiras entregas de produtos nas escolas indígenas. O PAA, operacionalizado pela Conab e financiado pelo MDS, tem uma abordagem de Compra com Doação Simultânea (CDS), que apoia a comercialização de produtos da agricultura familiar, com a doação sendo realizada no local de produção.
Este programa é particularmente relevante durante o inverno amazônico, quando as chuvas intensas e as correntezas do rio aumentam os desafios de transporte e comercialização. A estratégia do PAA visa reduzir os custos de venda e garantir a segurança na distribuição dos alimentos dentro das próprias comunidades, promovendo assim a nutrição e o bem-estar.
Expansão de Direitos e Sustentabilidade
Demarcação e Homologação de Terras Indígenas: Em um movimento significativo para os direitos dos povos indígenas no Acre, o Governo Federal anunciou recentemente a demarcação de novas terras. Entre as áreas demarcadas está a terra indígena do Rio Gregório, localizada em Tarauacá, uma região de grande importância cultural e ambiental para as comunidades locais. Além disso, houve a homologação da terra indígena Arara do Rio Amônia, situada em Marechal Thaumaturgo. Esta ação representa um marco no reconhecimento e na proteção dos territórios tradicionalmente ocupados por povos indígenas, garantindo-lhes maior autonomia e segurança na gestão de suas terras.
Fundo Amazônia e Desenvolvimento Sustentável: Paralelamente às medidas de demarcação, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) aprovou a alocação de R$ 33,6 milhões do Fundo Amazônia para o projeto de Gestão Territorial da Organização dos Povos Indígenas do Rio Juruá (OPIRJ). Este fundo foi estabelecido com o objetivo de apoiar iniciativas que promovam a proteção das populações tradicionais e dos povos indígenas, a preservação da floresta, a geração de emprego, renda e o melhoramento da qualidade de vida na região.
O projeto, que se estende por toda a região do Juruá no Acre, visa escalar estratégias desenvolvidas anteriormente no Projeto Alto Juruá, o primeiro do Fundo Amazônia a ser contratado diretamente com uma organização indígena, a Associação Ashaninka do Rio Amônia (Apiwtxa), iniciado em 2015. Este novo financiamento permitirá a implementação de ações focadas na gestão ambiental e territorial, aquisição de equipamentos, segurança alimentar e melhoria da produção local, sem a necessidade de destruir a floresta.
O impacto esperado dessas ações é significativo, com benefícios diretos para aproximadamente 13 Terras Indígenas e 11 mil pessoas. O Fundo Amazônia e as políticas de demarcação de terras indígenas representam um importante passo em direção a um modelo de desenvolvimento que respeita os direitos dos povos indígenas e promove a sustentabilidade ambiental na região amazônica.
Segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), o número de focos de queimadas em Cruzeiro do Sul aumentou de 68 para 104 entre 1º de janeiro e 8 de agosto, comparando os anos de 2023 e 2024.
O aumento representa uma elevação de 52,94% nos focos de incêndio na região. Em comparação com outros municípios, Feijó lidera com o maior número de focos, seguido por Cruzeiro do Sul, que se encontra entre os municípios mais afetados pelo problema das queimadas em 2024.
De acordo com o Relatório Hidrometeorológico da Secretaria de Estado do Meio Ambiente do Acre, há uma previsão de chuvas abaixo da média para a região durante o trimestre de agosto a outubro. As condições de neutralidade do fenômeno El Niño e o aquecimento anômalo do Atlântico Tropical Norte influenciam na atividade e posicionamento da Zona de Convergência Intertropical, aumentando a variabilidade das chuvas e a temperatura na regiãO.
Além disso, o governo do Acre declarou situação de emergência ambiental em junho de 2024, em resposta à redução dos índices de chuvas e ao agravamento das condições dos cursos hídricos, que aumentam os riscos de incêndios florestais.
As queimadas têm impactos significativos na região, incluindo destruição da flora e fauna, degradação do solo, emissão de gases de efeito estufa, problemas de saúde pública e impactos econômicos sobre as propriedades agrícolas e florestais.
O Rio Tejo, um dos afluentes do Juruá, enfrenta uma seca severa, com a lâmina d’água atingindo apenas 12 centímetros em Marechal Thaumaturgo. Em alguns trechos, a profundidade varia entre 10 e 20 centímetros, comprometendo a segurança alimentar e a mobilidade das populações locais, incluindo a Terra Indígena Kuntanawa e outras comunidades.
Haru Kuntanawa relata que a viagem de barco da Terra Indígena até Marechal Thaumaturgo, que antes durava de quatro a seis horas, agora leva um dia inteiro, e esse tempo pode dobrar se houver transporte de mercadorias. “Antes a gente levava quatro, no máximo seis horas, agora é um dia inteiro para chegar em Marechal Thaumaturgo. E se vier com cargas, com coisa carregada, é bem dois dias para trazer até a nossa comunidade”, disse Haru.
A escassez de água tem causado falta de peixes e dificultado a caça, além de prejudicar as plantações devido às queimadas. Haru destaca a necessidade de novas práticas para reverter a situação. “As plantações estão morrendo já, mesmo a gente regando. Os peixes já praticamente não há mais. A gente vai pescar e não pega nada porque o rio está todo verde de lodo, a água praticamente tá inútil, sem condição de utilizar. Tudo isso é em decorrência das queimadas e desmatamento. Não dá mais pra gente pensar na economia da Amazônia com as mesmas práticas do passado, a gente precisa pensar na economia com novas práticas”, afirmou.
Haru sugere a recuperação das nascentes e igarapés, além do plantio de árvores amazônicas como o buriti e o açaí, visando suprir a necessidade de alimentos e gerar renda para as famílias. Ele alerta para a necessidade de consciência e ação por parte dos poderes públicos para proteger a floresta e seus recursos.
O Acre enfrenta uma das secas mais severas dos últimos anos, impactando diversos setores e comunidades. A situação levou à decretação de emergência tanto pelo governo estadual quanto pela Agência Nacional de Águas (ANA), que intensificaram esforços para mitigar os efeitos da escassez hídrica e das erosões nos leitos dos rios.
Impacto da Seca nos Rios Acre e Purus
A ANA declarou situação de escassez hídrica no Rio Purus, que atravessa os municípios de Manoel Urbano e Santa Rosa do Purus, devido ao nível de água estar abaixo da média. A Defesa Civil Estadual reportou que a falta de chuvas agravou a situação, dificultando o transporte de insumos e a produção agrícola na região. Além disso, o transporte escolar foi prejudicado, pois alunos dependem da travessia do rio para chegar às escolas.
A queda no nível dos rios não se limita ao Purus. O Rio Acre, principal afluente do estado, está com o nível abaixo de 2 metros há mais de 40 dias, atingindo 1,49 metro, o menor registro em 2024. Esse cenário já causa prejuízos significativos em Rio Branco e outras cidades.
Decretos de Emergência e Erosões
O governo do Acre, por meio do governador Gladson Cameli, decretou estado de emergência por conta das erosões nas margens dos rios Acre e Envira, bem como pela seca extrema. Em Rio Branco, as erosões no Calçadão do Novo Mercado Velho e na Passarela Joaquim Macêdo levaram à interdição desses locais devido ao risco à população e aos prédios históricos.
O decreto de emergência autoriza a realização de despesas necessárias para a instalação e manutenção de abrigos, fornecimento de insumos e suporte logístico, visando a manutenção da capacidade de resposta do poder público.
Ações Governamentais
Para enfrentar a seca, o governo estadual criou um gabinete de crise, que atuará até o final do ano, para discutir e implementar medidas emergenciais. Entre as ações, está a distribuição de 30 milhões de litros de água para comunidades rurais, atendendo inicialmente 19 mil pessoas.
Além disso, sete cidades do Acre já estavam em emergência por conta da seca extrema: Rio Branco, Feijó, Epitaciolândia, Bujari, Porto Walter, Cruzeiro do Sul e Plácido de Castro. A seca antecipada, que contrastou com a enchente histórica vivida no início do ano, fez com que mais de 11 mil pessoas deixassem suas casas.
Monitoramento e Previsões
A Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Sema) destacou que a seca está associada ao prolongamento dos efeitos do El Niño, que reduziu significativamente as precipitações. A previsão para os próximos meses não é animadora, com estimativas de chuvas abaixo da média, o que pode agravar ainda mais a situação.
Em resposta, a ANA intensificou o monitoramento dos rios em atenção especial, enquanto o governo estadual busca alternativas para garantir o abastecimento hídrico e minimizar os impactos da seca na agricultura e na vida das comunidades afetadas.
O cenário de seca no Acre exige uma coordenação eficaz entre os governos estadual e federal, bem como a colaboração da sociedade, para superar os desafios impostos pela escassez hídrica e preservar a segurança e o bem-estar da população.