Após fortes chuvas, Rio Acre apresenta elevação preocupante em seu nível, na cidade de Assis Brasil, na fronteira do Brasil com o Peru. Essa situação já forçou mais de 50 famílias a deixarem suas casas. “Na terça-feira (20), a partir das 22h, iniciou uma forte chuva que durou toda a noite e entrou pelo outro dia, a gente começou a receber chamadas de pessoas que precisavam de auxílio. No início da tarde de ontem, o nível do rio Acre então começou a assustar e a subir rapidamente”, explica prefeito Jerry Correia.
Com o rio alcançando 12 metros, próximo à cota de transbordamento de 12,50 metros, o risco se estende para além de Assis Brasil, afetando também as cidades de Brasiléia e Epitaciolândia. O Centro de Operações de Emergência da região de Madre de Dios, no Peru, emitiu um alerta de inundação, indicando a gravidade da situação.
Em Rio Branco, a Prefeitura, através da Defesa Civil Municipal, já ativou seu plano de contingência, preparando-se para possíveis eventos. “O nosso plano de contingência já está vigente. Todas as secretarias estão cientes do que pode acontecer. Se tiver alguma ocorrência, as nossas secretarias já estão em condições. Estamos preparados e em condições de atender qualquer evento que venha acontecer na nossa cidade de Rio Branco”, destaca coronel Sandro Cassiano, coordenador em exercício da Defesa Civil de Rio Branco.
O coronel Carlos Batista, coordenador da Defesa Civil do Acre, informaou que a água deve levar pouco mais de 60 horas para chegar à capital, destacando a influência de mais chuvas na região dos afluentes. “Essa onda vem descendo, claro se tiver mais chuvas na região dos afluentes, isso vai favorecer ainda mais uma subida aqui na capital”, comenta Batista.
Entre os dias 20 e 23 de agosto, Rio Branco recebe a terceira edição do Fórum de Bioeconomia da Amazônia. O evento será realizado no auditório do Sebrae Acre, com abertura no dia 20, na Federação das Indústrias do Estado do Acre (FIEAC), onde ocorrerá o Bioeconomy Amazon Summit – BAS Itinerante.
Com o tema “A Industrialização da Bioeconomia Amazônica Acreana: do bambu ao cupuaçu”, a programação trará debates sobre cadeias produtivas estratégicas da região, como bambu, cacau, açaí, óleos naturais, extratos florestais e mel. O fórum reunirá especialistas, empreendedores, pesquisadores, investidores, startups e comunidades tradicionais, promovendo trocas de conhecimento e articulação institucional.
Entre os convidados internacionais estão Chua Seng Chee (Avery), diretor-presidente da maior indústria de processamento de bambu fora da China, e Michel Abadie, presidente da World Bamboo, da França. O encontro também contará com painéis sobre a vocação do Acre para a produção de cupuaçu, as oportunidades do mercado global de produtos florestais não madeireiros e a valorização do artesanato de base comunitária.
A coordenadora do fórum, Mirla Moraes Miranda Mariano, destacou que o objetivo é consolidar o Acre como referência em bioeconomia: “Queremos fortalecer as cadeias produtivas locais e atrair investimentos que reconheçam o potencial da sociobiodiversidade amazônica”, afirmou.
Além das palestras e painéis, o evento oferecerá estandes de produtos florestais já existentes, como óleos, chocolates artesanais, compotas e artesanato. A organização reforça que será uma oportunidade de networking e construção de parcerias estratégicas entre setor produtivo, comunidades e investidores.
O Governo Federal, por meio da Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil, oficializou nesta segunda-feira (18) o reconhecimento da situação de emergência em 21 municípios do Acre atingidos pela seca prolongada. A medida foi publicada no Diário Oficial da União por meio da Portaria nº 2.521, de 2025.
O reconhecimento federal tem como base o Decreto nº 11.733, editado pelo governo estadual em 6 de agosto, e os documentos encaminhados à Defesa Civil Nacional que comprovaram os impactos da estiagem. A partir da decisão, as prefeituras passam a ter acesso facilitado a recursos da União, destinados a ações de resposta imediata e de apoio à população. Entre as medidas previstas estão a distribuição de água potável, apoio logístico e recuperação de áreas danificadas.
Foram contemplados na portaria os municípios de Acrelândia, Assis Brasil, Brasiléia, Bujari, Capixaba, Cruzeiro do Sul, Epitaciolândia, Feijó, Jordão, Mâncio Lima, Manoel Urbano, Marechal Thaumaturgo, Plácido de Castro, Porto Acre, Porto Walter, Rodrigues Alves, Santa Rosa do Purus, Sena Madureira, Senador Guiomard, Tarauacá e Xapuri.
Segundo a Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil, o reconhecimento da emergência é um instrumento fundamental para garantir celeridade na liberação de recursos e minimizar os efeitos da estiagem sobre as comunidades mais vulneráveis. O governo do Acre já havia destacado que a situação exigia resposta articulada, diante da intensificação do período seco e da necessidade de assegurar abastecimento de água em localidades isoladas.
A decisão também permite que os municípios apresentem planos de trabalho para financiamento de ações emergenciais, como transporte de insumos, assistência humanitária e recuperação de estruturas comprometidas pela seca.
O Fundo Amazônia, criado em 2008 e gerido pelo BNDES sob coordenação do Ministério do Meio Ambiente, completou 17 anos em 2025 consolidando-se como o maior programa de financiamento de políticas públicas e projetos socioambientais voltados à conservação da floresta e ao fortalecimento das populações tradicionais. Nesse marco, a participação de lideranças indígenas foi central, entre elas a de Francisco Piyãko, coordenador da Organização dos Povos Indígenas do Rio Juruá (OPIRJ) e liderança Ashaninka da comunidade Apiwtxa, em Marechal Thaumaturgo (AC).
Participação no evento “Raízes e Rumos”
Durante a celebração dos 17 anos, em Manaus, nos últimos dias 12 e 13, Piyãko destacou a relevância do Fundo Amazônia como instrumento estratégico de proteção territorial. “Nós povos indígenas, seja aqui no Juruá ou em qualquer lugar onde a gente esteja, lutamos para manter os nossos direitos já conquistados. Não estamos inventando nada. E a gente tem que estar sempre atento, porque dá pra ver que tem muitos trabalhando pra tirar esse direito”.
O dirigente da OPIRJ sublinhou que o encontro foi também um espaço de avaliação: “Foi feito um trabalho de alinhamento, em olhar para o futuro. A partir dessas experiências, a gente foi olhando onde tem que mudar, onde tem que melhorar para ajustar cada vez mais. Esse programa ganha muita confiança hoje, tanto nos territórios quanto na esfera nacional e internacional”.
A trajetória do Fundo Amazônia com a Apiwtxa e a OPIRJ
A comunidade Apiwtxa, referência na luta pelo território Ashaninka, foi protagonista no acesso direto ao Fundo Amazônia. Entre 2015 e 2018, coordenou o Projeto Alto Juruá, com investimento de R$ 6,5 milhões, voltado ao manejo agroflorestal, monitoramento territorial e fortalecimento comunitário. A avaliação independente realizada pela GIZ mostrou que, durante sua execução, a taxa de desmatamento nas áreas apoiadas caiu em 64,6%, resultado muito acima da média dos demais projetos financiados no período.
A partir dessa experiência, a OPIRJ estruturou o projeto Gestão Territorial, retomado em 2023 após a reativação do Fundo, com foco na proteção e gestão de 13 Terras Indígenas da região. Em 2023, a parceria foi ampliada com a assinatura de contrato de R$ 33,6 milhões entre BNDES e OPIRJ, na presença das ministras Marina Silva e Sônia Guajajara e da presidenta da Funai, Joenia Wapichana.
“Esse é um projeto básico para a gente começar e dar para fazer muito trabalho nessas comunidades indígenas. A gente tem o desafio e o compromisso de fazer esse projeto andar de acordo com seu espírito”, afirmou Piyãko, ao lado de lideranças indígenas e autoridades federais.
Impactos e desafios
O Fundo Amazônia, segundo Piyãko, transformou-se em um caminho para a ampliação de recursos destinados diretamente aos territórios, durante o evento dos 17 anos, ele pontuou a necessidade de avanços também: “Tem um desafio muito grande que a gente colocou: como acessar de maneira direta esses recursos. Às vezes o programa é muito bem elaborado, mas a ponta tem dificuldade de acessar. Estamos nesse processo”.
Ele destacou ainda que os critérios de acesso — como capacidade técnica e compromisso com a causa ambiental — são fundamentais: “Tem que ter capacidade técnica e compromisso com a causa ambiental, com as populações tradicionais. Isso às vezes incomoda alguns porque querem ter o recurso, mas não têm o compromisso”.
Perspectiva histórica e política
No balanço, Piyãko reconheceu o Fundo Amazônia como o maior programa de impacto direto na proteção territorial: “É o maior programa que a gente teve nesses últimos tempos, que traz resultado, que impactou direto nos territórios para proteção, para manter a floresta de pé, fortalecendo as comunidades e as organizações locais, equipando o Estado e investindo em ciência e tecnologia”.
A trajetória, porém, não foi linear: o programa foi paralisado entre 2019 e 2022, durante o governo Bolsonaro, o que comprometeu a continuidade de projetos em curso. A retomada a partir de 2023 recolocou em pauta iniciativas indígenas de gestão ambiental e fortalecimento comunitário.
Avanço no Juruá
Francisco Piyãko lembrou que a história da comunidade Apiwtxa abriu o caminho para o protagonismo indígena no Fundo Amazônia. “A experiência da Apiwtxa mostrou que nós tínhamos condições de acessar diretamente esses recursos e transformar em resultados concretos para o território. Ali começamos com o Alto Juruá e provamos que era possível”, destacou.
Ele explicou que esse percurso levou à criação de um novo projeto, com a OPIRJ, tendo assim uma articulação regional capaz de ampliar o alcance das ações. “Hoje, com a OPIRJ, conseguimos avançar para as 13 terras indígenas do Juruá. Essa ligação entre o que fizemos na Apiwtxa e o que estamos fazendo agora com a OPIRJ é muito grande, porque mostra que não é um projeto isolado, mas uma construção coletiva para o futuro do nosso povo”, afirmou.
Para Piyãko, a consolidação desse processo representa um marco para todo o Vale do Juruá. “O tamanho disso é que agora não é só uma comunidade, mas uma região inteira fortalecida. O Fundo Amazônia nos permitiu dar esse salto e mostrar que o Juruá pode ser referência de gestão territorial e de sustentabilidade para a Amazônia”, concluiu.
O Projeto Gestão Territorial, coordenado pela OPIRJ com apoio do Fundo Amazônia, beneficia cerca de 11 mil pessoas. A iniciativa está estruturada em quatro eixos: fortalecimento institucional das organizações indígenas, aquisição de equipamentos e infraestrutura, promoção de atividades produtivas sustentáveis e valorização cultural. Entre as ações em andamento estão a capacitação de lideranças, a criação de planos de gestão territorial e ambiental, e o apoio a associações e cooperativas indígenas para ampliar sua capacidade de representação e de diálogo com instituições públicas e privadas.
Na prática, o projeto vem implementando sistemas agroflorestais, investindo em segurança alimentar e na recuperação de áreas degradadas, além de organizar estratégias de monitoramento para proteger os territórios contra invasões e pressões externas. Também promove estudos e pesquisas sobre o patrimônio cultural material e imaterial dos povos indígenas do Juruá, fortalecendo identidades e tradições locais. Com esse conjunto de medidas, o Gestão Territorial busca consolidar um modelo de desenvolvimento que alia proteção ambiental, autonomia comunitária e geração de renda sem abrir mão da floresta.