As lideranças indígenas dos povos Ashaninka e Yawanawa, Francisco Piyãko, Wewito Piyãko e Biraci Brasil, participaram na noite desta quarta-feira, 20, no Sesc Pompéia, em São Paulo, do debate sobre a situação das terras indígenas no Acre, promovido durante a exposição “Amazônia”, do fotógrafo e ativista internacional Sebastião Salgado.
Em sua fala, Francisco contou sobre como o povo Ashaninka do Rio Amônia, em Marechal Thaumaturgo (AC), conquistou a demarcação e em seguida recuperou a região, que estava devastada. Atualmente, a Terra Indígena Kampa do Rio Amônia é constituída de vasta diversidade em fauna e flora, e fartura de alimentos produzidos por meio do sistema agroflorestal e dos roçados tradicionais, cultivados pela comunidade.
“O nosso povo tem um entendimento de que não há vida sem floresta, sem essa natureza. Nós nascemos e vivemos dela, nos comunicamos com ela e, por isso, sabemos dos seus limites, bem como o que ela tem a nos oferecer. Não nos vemos desligados da natureza, vemos a vida a partir da responsabilidade de não agredir essa corrente. Os indígenas sabem disso, os cientistas também já comprovaram isso. Se a gente não cuidar e se isso não for entendido e compreendido pela alma da gente e pelo Espírito, a gente não sustenta e cuida do Planeta”, endossou Francisco.
Francisco também destacou o olhar global que os povos indígenas possuem e que, muitas vezes, os não-indígenas ignoram. “Nós estamos lá dentro da floresta e conseguimos enxergar vocês aqui, já vocês não conseguem enxergar a gente lá. Talvez, tenhamos uma visão mais global, pois estamos preocupados com o Planeta. E isso é um grande diferencial, pois quando pensamos em desenvolver, pensamos de maneira compartilhada, com o todo”, destacou.
povo Ashaninka deixa mensagem de união em exposição de Sebastião Salgado Foto: Cedida
Francisco Piyãko fez uma crítica ao garimpo, exploração de minérios e o comércio, observando que “não faz sentido” tirar ouro da natureza, já que não há uma relação de benefício à natureza e às pessoas. “Outra coisa que não faz sentido é o acúmulo de riquezas. O tempo é outro. Quanto mais você acumula riquezas, mais paredes vocês criam para ‘se proteger’. Isso não faz sentido! Para nós, o que nos protege é a floresta”, disse.
O presidente da Associação Apiwtxa, Wewito Piyãko, que também participou do debate, chamou a atenção para a importância da união entre os povos. “É necessário que estejamos juntos, indígenas e não indígenas, na defesa do Planeta. No nosso território, por exemplo, há muitos anos seguimos resistindo e lutando contra invasores madeireiros e caçadores. Para isso, criamos um diálogo constante com as comunidades vizinhas para que juntos possamos cuidar de nossos territórios”, afirmou.
Outro ponto importante abordado por Wewito foi a construção da estrada UC-105, que liga o Peru à região do Vale do Juruá, no Acre, e afeta diretamente os territórios indígenas e áreas de reservas. “A estrada que estão construindo já saiu no nosso rio Amônia. E esse é um caminho de coisas ruins, pois vão desmatar a nossa floresta, poluir as nossas águas, invadir nossos territórios. Não estamos protegendo a floresta apenas para nós, mas, para o mundo. E para que as pessoas compreendam mais a nossa luta, história e conhecimentos, passamos a trabalhar a comunicação e mostrar para o mundo. Pois, nós não somos atrasados, como dizem, somos avançados dentro do nosso conhecimento e da floresta”, afirmou, encerrando sua participação com um canto tradicional do povo Ashaninka.
Mediado pelo jornalista Leão Serva, a conversa tratou da situação dos povos indígenas que vivem no território acreano e como se dão os conflitos gerados a partir da construção de estradas que cortam a região. O painel pode ser visto no canal de Youtube do Sesc Pompeia.
O presidente Lula (PT) participou, neste sábado, do painel “Florestas: Protegendo a natureza para o clima, vidas e subsistência”, realizado durante a COP28 em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos. Durante o evento, Lula expressou sua emoção ao abrir espaço para a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva (Rede), para fazer o uso da palavra. “Precisamos de 28 edições da COP para que, pela primeira vez, a floresta viesse falar por si só. E eu não poderia utilizar a palavra sobre a floresta, se eu tenho no meu governo uma pessoa da floresta. A Marina nasceu na floresta”, disse.
Lula declarou que tinha um discurso preparado, mas optou por ceder a palavra a Marina, destacando a importância de ouvir a voz da ministra, uma vez que ela é nascida na floresta e desempenha um papel fundamental na política de preservação ambiental do governo. Ele ressaltou a justiça em permitir que a responsável pelo sucesso das ações ambientais do país falasse sobre o tema.
“A Marina nasceu na floresta, se alfabetizou aos 16 anos. Eu acho que é justo que, para falar da floresta, ao invés de falar o presidente, que é de um Estado que não é da floresta, a gente tem é que ouvir ela, que é a responsável pelo sucesso da política de preservação ambiental que nós estamos fazendo no Brasil”, declarou o presidente, emocionado.
Marina Silva, por sua vez, apresentou um breve relato das políticas federais para a preservação da floresta, enfatizando as ações de combate ao desmatamento ilegal na Amazônia. Segundo ela, tais medidas resultaram em uma redução de 49,5% na derrubada da floresta nos 10 primeiros meses de governo, evitando a emissão de 250 milhões de toneladas de CO2.
Além disso, a ministra destacou a importância das políticas para os povos indígenas e quilombolas na preservação das florestas. “Os povos originários são responsáveis por 80% das florestas protegidas do mundo, e o povo quilombola agora também tem uma mulher, uma mulher negra, Anielle Franco, uma jovem que está ajudando a proteger a floresta com o povo quilombola”, ressaltou.
Marina Silva salientou que a abordagem do governo não é setorial, permeando todos os ministérios, e mencionou o Plano de Transformação Ecológica apresentado pelo Ministério da Fazenda como um exemplo dessa visão sistêmica. Em relação ao presidente Lula, a ministra destacou que sua diretriz para proteger a floresta vai além do comando e controle, sendo uma orientação para o desenvolvimento sustentável em suas dimensões ambiental, social, econômica e cultural.
Durante a COP, o Brasil propôs que os países com Fundos Soberanos invistam pelo menos US$ 250 bilhões em um Fundo para a manutenção das florestas tropicais em todo o mundo.
Um estudo recente publicado na revista “Perspectives in Ecology and Conservation” aponta que o estado do Acre pode estar experimentando uma mudança significativa nos padrões de eventos climáticos extremos desde o ano de 2010. A pesquisa, realizada em colaboração entre a Universidade Federal do Acre (UFAC), a Universidade Estadual do Ceará (UECE), o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) e o centro de pesquisas americano Woodwell Climate, indica que o estado pode ser uma das regiões brasileiras mais afetadas por esses eventos.
Os pesquisadores analisaram uma série de estudos publicados entre 1987 e 2023, assim como decretos estaduais e municipais relacionados a alertas climáticos e ambientais emitidos no mesmo período. Os dados revelam que nos últimos 36 anos, o estado enfrentou 254 eventos climáticos extremos. Desde 2010, há uma tendência constante de aumento na frequência e intensidade dessas ocorrências, quebrando o padrão observado até então.
Sonaira Silva, pesquisadora da UFAC e autora do estudo, destaca que a partir de 2010, houve uma ruptura no padrão anterior. Até 2004, a média indicava um evento extremo por ano nas cidades acreanas. No entanto, desde então, e especialmente após 2010, dois ou mais eventos têm sido registrados com frequência no mesmo ano em um mesmo município. Silva explica que esse é o padrão emergente, indicando que o ambiente não está se regenerando adequadamente após cada evento, tornando-se mais frágil a cada ano.
Durante o período analisado, o estudo revela que 60% das ocorrências foram caracterizadas como incêndios florestais ou queimadas em áreas desmatadas, 33% foram inundações e 6% crises hídricas. Silva destaca que as pessoas mais afetadas geralmente estão em áreas de risco, sendo mais pobres e com menos estrutura. As perdas econômicas em larga escala também são preocupantes, com o Acre tendo o maior custo financeiro por evento entre todos os estados brasileiros entre 2000 e 2015, estimado em mais de 15 milhões de reais a cada crise.
A equipe identificou que as áreas mais populosas, como a capital Rio Branco e o município de Cruzeiro do Sul, são as mais afetadas. “As regiões com menos floresta são aquelas em que os eventos climáticos ocorrem com mais frequência, mas o prejuízo está por todos os lados”, observa Silva.
Para mitigar a situação, a pesquisadora sugere a recomposição da vegetação nativa, a adaptação das cidades para modelos mais sustentáveis e inteligentes, e o cumprimento de políticas e legislações ambientais. Concluindo, ela destaca a necessidade de continuar monitorando de perto a situação para auxiliar na tomada de decisões que possam alterar esse cenário crescente de eventos extremos.
Confira o estudo: https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S253006442300072X
O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) conduziu a operação Inopinus Flora na Vila Caquetá, município de Porto Acre, nesta quarta-feira, 22, com o objetivo de combater o desmatamento ilegal na região. Os resultados da operação incluíram a apreensão de aproximadamente 96,41m³ de madeira, bem como o fechamento de 08 serrarias que operavam sem a devida licença ambiental.
Segundo o IBAMA, as serrarias foram notificadas em 2022 para regularizar sua situação, entretanto, persistiram em operar sem a devida licença ambiental. Além disso, havia indícios de que a madeira apreendida era oriunda da Terra Indígena Apurinã do KM 124, localizada no município de Boca do Acre-AM. De acordo com a Lei de Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/1998), a extração de madeira nessa área configura crime ambiental, sujeito a multas, apreensão de maquinário e até mesmo prisão.
A operação contou com o apoio da Força Nacional de Segurança Pública, responsável pela escolta dos agentes do IBAMA e dos caminhões que transportaram a madeira apreendida.
O material confiscado será avaliado e destinado para programas sociais. Em comunicado, a coordenação da operação destacou que a ação visa proteger o meio ambiente e os direitos dos povos indígenas, ressaltando a importância da operação para coibir o desmatamento ilegal na região, que afeta a biodiversidade, o clima e, especialmente, a vida dos indígenas.
Com informações da Assessoria – Foto: Arquivo/IBAMA